25 de junho de 2010

Não concorde caso discorde

A palavra indignação provém do latim “indignari” e significa ira ou revolta.

Ora ou outra aparece na mídia ou em nosso convívio pessoal e interpessoal atitudes e fatos que nos deixam extremamente transtornados. Chegando a pensar que o autor do ato não pode pertencer à mesma espécie que você. Fatos e atos que nos deixam intimamente indignados. Isso é bom. Evidente que crueldades não são boas. O bom é ainda termos forças e caráter para dizer que não concordamos.

Demonstrar-se indignado é, sem dúvida, uma forma verdadeira de que ainda existe uma esperança. Reafirma a presença real, por mais distante e sutil, de valores básicos à coexistência entre indivíduos civilizados. Requisitos fundamentais para a sobrevivência de nossa espécie, além da partícula divinal que preenche nossa própria existência. Tais conotações nos atribuem a habilidade de modificar com alguma exatidão nossos caminhos, atuando sobre os indivíduos particularmente, e sobre a coletividade social em que está inserido. Entretanto, se faz necessário ressalvar, que a completa manifestação destas habilidades só surgirá se forem observadas duas premissas importantes neste contexto: a liberdade e a justiça.

Se estiver correto o raciocínio acima, o detrimento gradual de nossa habilidade de ficarmos indignados retrata, indubitavelmente, o hediondo desvirtuamento do conceito de liberdade, espalhando a sensação de iniquidade e impunidade. A distância que nos separa da liberdade, certamente, tem a mesma proporcionalidade da inconsistência e ineficiência da justiça nos dias atuais.

Essa ausência de justiça nos tirou a capacidade de conhecer o que é liberdade, em sua essência. A "liberdade", que digo, refere-se à autonomia que todos devem ter de compreender os interesses coletivos em que está inserido e à capacidade de tornar-se o que bem entender, no auxílio de sua comunidade. Sendo assim, a possibilidade de concluir seus projetos de vida está ao alcance de todos, acatando as leis que moderam as conveniências e responsabilidades individuais, gerando uma sensação coletivizada de "justiça". A partir da interação entre os conceitos mencionados, emerge objetivamente um terceiro elemento, que sobrepuja os primeiros mantendo-os em perfeita harmonia funcional: a “ordem”.

Liberdade, no oriente, não significa um experimento lúdico, advento de um comportamento desordenado, antes uma necessidade natural da própria subsistência humana. No ocidente, desde Sócrates a Locke, Voltaire, Rousseau, Montesquieu e outros adeptos do iluminismo no século XVIII, a liberdade transmutou-se em uma ideologia ardilosa, deturpada de forma premeditada e cada vez mais ligada a falsas doutrinas. No século XIX, com o princípio da revolução industrial e o desenvolvimento do liberalismo econômico, as constantes distorções de seu real conceito a transformou em algo quase que abstrato e inatingível. Em meados do último século, a liberdade, assim como outros diversos conceitos menos importantes, transformou-se em um falso objeto dogmático incontestável e primordial, porém para poucos afortunados, período no qual a liberdade se tornou pretexto para grandes guerras sangrentas, frias e, mais tarde, tecnológicas.

Para que possamos atingir a liberdade, conhecer a justiça em toda sua plenitude e consequentemente chegarmos à ordem, é necessário que descondicionemos o conceito de liberdade e possamos, de fato, entender a concepção plena da "liberdade humana", que só irá acontecer sob o estado irrestrito da ordem e da lei. Se liberdade está intimamente relacionado à natureza humana, a ordem também estará. O Estado é o resultado da deliberação coletiva e concludente da sociedade, expresso no seu ordenamento jurídico, o qual deve ser seu principal instrumento. A sociedade só desfrutará da absoluta justiça quando todos os seus cidadãos tiverem a garantia do seu direito de exprimir a sua humanidade em seu mais amplo sentido. Essa garantia deve ser assegurada pela norma jurídica e defendida pelo Estado.

Assim, temos o dever cívico e a obrigação pessoal de nos indignarmos com a bagunça generalizada que se estabeleceu numa vastidão de conceitos viciados por liberais e socialistas, modificando o ordenamento jurídico quando este não mais for capaz de proteger a sociedade das artimanhas de todos os gêneros e conotações fundamentalistas, populistas e sensacionalistas. Ao mesmo modo que devemos proteger este ordenamento contra radicais que pretendam cercear esta liberdade, usurpando-a aos seus interesses. Só então caminharemos ao oposto da realidade sombria que hoje paira sobre nossa sorte.

9 comentários:

  1. Saudações!
    Amigo Sérgio:
    Confesso que ainda estou refletindo sobre a magnitude de sua mensagem. É um artigo muito profundo, agora, vou tentar resumir sobre o que me passou a sua explanação: se desde a infância, pais e escola transmitissem o valor da liberdade, sustentando-a em plena verdade, que cada ato imoral decepa a senhora liberdade dando destaque que, a moralidade jamais deveria fazer ponte associada a alguma sentença, e sim amplamente fundamentada suas raízes aos direitos e deveres de cada cidadão elevando-se o homem moral a alforria e ao pleno exercício de suas oportunidades rumo a uma evolução saudável sem prejuízo ao próximo em cumprimento de seus mais elevados propósitos por estas paragens. No momento é o que penso meu amigo.
    Parabéns por mais uma excelente leitura!
    Ótimo Post!
    Abraços,
    LISON.

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  2. Amigo Sérgio, o seu texto está sensacional. Muitas vezes ficamos indignados com certas coisas, mas isso é porque acreditamos que tais fatos não devem ser pautados sem o devido respaldo. Acredito que temos a liberdade de expressão, desde que essa seja condizente com a veracidade dos fatos, e se isso não acontece, ficamos indignados mesmo, pois não podemos falar de algo que não sabemos, ou que simplesmente ouvimos dizer. Parabéns pela postagem. Abraços. Roniel.

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  3. Gostei muito do texto amigo Sérgio.
    Resolvi fazer uma leitura um pouco diferente... pois me parece que a lei e ordem ficam sendo estabelecidas pelo contexto social em que se está inserido e, muitas vezes, este contexto pode cercear a própria liberdade.
    Dito isto me parece que, em relação a liberdade, seria um conceito mais universal... mais próximo a carta dos direitos do homem (no sentido original, sem a manipulação jurídica que ocorre para beneficiar este ou aquele no âmbito jurídico). Com estes direitos preservados acredito que teríamos liberdade, dentro de um contexto aceitável e comum.
    Porém, como bem ilustrasse no texto, teríamos que ter uma boa base de justiça para firmar estes preceitos da carta. Enfim, fazê-los serem respeitados.
    Com tudo respeitado entramos nos âmbitos dos deveres... que muitos se "esquecem"... rsrs... E, estes sim, dependeriam do contexto social, mas não deveriam nunca sobrepor os direitos universais.
    Porém mesmo com os direitos e deveres firmados. Tudo dependeria do acompanhamento constante do respeito destas "leis". E nisto me parece positivo a indignação frente a quem desrespeita o senso coletivo e prejudica outro ser humano ou mesmo a sociedade.
    Parabéns pelo belo texto.
    Forte abraço, Fernandez.

    P.S. desculpe-me me estender, mas gostei do assunto. :-)

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  4. ...traigo
    sangre
    de
    la
    tarde
    herida
    en
    la
    mano
    y
    una
    vela
    de
    mi
    corazón
    para
    invitarte
    y
    darte
    este
    alma
    que
    viene
    para
    compartir
    contigo
    tu
    bello
    blog
    con
    un
    ramillete
    de
    oro
    y
    claveles
    dentro...


    desde mis
    HORAS ROTAS
    Y AULA DE PAZ


    TE SIGO TU BLOG




    CON saludos de la luna al
    reflejarse en el mar de la
    poesía...


    AFECTUOSAMENTE
    SERGIO

    ESPERO SEAN DE VUESTRO AGRADO EL POST POETIZADO DE BLADE RUUNER , CHOCOLATE, EL NAZARENO- LOVE STORY,- Y- CABALLO.

    José
    Ramón...

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  5. Olá Sérgio!
    Maravilhoso e profundo este texto.Me fez pensar em algo que vi há poucas horas e me trouxe um pouco de indignação, pelo perigo que traz uma atitude de desrespeito ao outro, à ordem e à própria liberdade, num conceito mais amplo. Há exemplos muito piores,claro,mas o que presenciei, há pouco, em um vídeo, foi quando um rapaz, suponho que jornalista ou humorista, do programa CQC (que eu começava a gostar), desligou várias vezes a TV, na Argentina, durante o jogo de futebol da Argentina,contra um outro time que nem me lembro. Fiquei indignada porque, pois, no final da "comédia", rapazes argentinos mostraram que haviam comentado que tal atitude, só poderia vir de brasileiros. Além disto, me pergunto, até que ponto por ser um programa de TV, é lícito dar-se este tipo de exemplo de desrespeito ? num tempo em que estamos ainda na luta por convencer o povo, de que devem ser respeitosos e comportar-se com civilidade e ordem, quando em um estádio de futebol, assistindo a jogos ! Sei que muitos ficarão contra este meu comentário porque o CQC é um programa adorado por muita gente, mas é aí mesmo que eu acho que a responsabilidade por defender os ideais de "liberdade", deveriam ser levadas mais à sério.
    Acho que este texto me fez lembrar do que este vídeo, que vi no intervalo do jogo do Brasil hoje,me fez sentir. Aproveitei então, para comentar, pois não achei justo( e se fosse aqui no Brasil? como seria a reação?),se alguém reagisse à altura, provavelmente seria criticado, como se não tivéssemos o direito de reclamar da falta de respeito. Concordo com você, o respeito e a ordem são necessários quando se quer liberdade.
    Abraço,
    Vera.

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  6. Excelente postagem Sérgio.
    Estou de acordo; acredito que liberdade seja esta autonomia de fazer o que quiser, desde que se faça tendo em vista o bem comum, ou que não venha a prejudicá-lo.
    A indignação é sempre o primeiro passo para a evolução, para a mudança, mas é indispensável que não seja feita em desacordo com os príncípios que asseguram a manutenção da ordem; caso contrário, a liberdade passa a ser, de fato, apenas uma "ideologia ardilosa".

    Grande abraço

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  7. Depende do seu interesse, se concordar com a pessoa vai te fazer seguir um caminho mais facil para cativar uma pessoa, isso é valido.

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  8. E um dos momentos mais propícios para mostrar a nossa indignação e dar início à limpeza da "bagunça generalizada" que estamos vivendo é o do voto. Através dele podemos começar uma revolução ética e moral, primeiro passo para liberdade que todos sonhamos. A partir daí, como está no texto, "caminharemos ao oposto da realidade sombria que hoje paira sobre nossa sorte".

    Parabéns pelo post, Sérgio!

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  9. Sérgio,
    Meu velhinho sempre dizia.
    Se você tem certeza de estar com a razão vá até o inferno para mostrar isso. Agora, caso não tenha, peça desculpas.
    Abraços!

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